A NUVEM SE DISSIPA / Davambe

Quando Manuel Khatissa Mulhovu nasceu, causou tamanho espanto que era como se nuvens escuras tivessem tomado o povoado de Manguluane. O preconceito, a intolerância e o desconhecimento transformaram as nuvens pesadas em tempestade, e sua mãe, Tavita Ndjombo, não viu outra saída a não ser deixar sua cidade natal em busca de céus mais amenos. Essa história aparentemente simples – de alguém que não se encaixa e, por isso mesmo, decide partir –, tantas vezes contada desde que o mundo é mundo, em A nuvem se dissipa adquire um novo significado pelas mãos de Davambe, que empreende uma fascinante reflexão sobre reinventar-se, pertencer e conquistar.

“Naquela hora a angústia se apossou da mãe preta, que tentava saber como poderia ter sido engravidada por aquele homem, de quem nunca havia se aproximado, nem mesmo nada dele tinha recebido. Foi então que se deu conta da gravidade da situação, de parir um ser com uma cor diferente da sua e do esposo. Olhou para o bebê e confirmou mesmo, agora achava estranho, deteve-se, olhou demoradamente, seu olhar iluminou o menino, ele sorriu, mexendo as perninhas e agitando os bracinhos. A criança nasceu em casa e ela estava consciente, de modo que não havia chance de o bebê ter sido trocado no hospital.”

“Filho, sei que você veio da minha barriga, mas é pouco esse saber.”
Tavita Ndjombo não entende por que seu filho nasceu branco.

“Na verdade, não sei de onde está vindo nem para onde está indo.”
Apenas entende, apesar da dificuldade em aceitá-lo, que precisa desbravar um novo caminho para ambos e só pode contar com a própria coragem.

“Só sei que você chega numa terra já habitada, que possui suas regras e tudo o mais, vai sofrer, mas não perca a esperança de dias melhores.”
Tavita tem medo, sim, como todos temos diante do desconhecido, daquilo que nunca desejamos que nos acontecesse e que fomos obrigados a enfrentar pelas vicissitudes da vida, das pessoas.

“Apesar dos que impõem a mão de ferro, ainda há esperança de dias melhores.”
Tavita também tem esperança. Muita! Em situações assim, a única opção é seguir em frente.

 “Siga firme, é o que posso lhe desejar. Siga o seu caminho, meu filho, os obstáculos são infinitos, não perca esperança nem se assuste como os que se assustam hoje com a sua chegada.”
A mãe preta sabe que na vida muitas coisas não conseguimos explicar... ainda. E por isso logo trata de recuperar-se do susto.

“Eu torço por você e estou curiosa para saber o que veio fazer neste mundo, que já tem tudo e ao mesmo tempo não tem nada.”
O filho branco, Manuel Khatissa Mulhovu, parece ter menos que nada, já que tão cedo lhe subtraíram suas raízes, mas tem a Tavita. O que não é pouca coisa... É tudo!

“Seja bem-vindo, querido.”
Sejam bem-vindos, leitores e leitoras, à sensível história de Tavita e Manuel, mãe e filho na busca – ancestral – por um lugar no mundo.

Davambe nasceu em Maputo, capital de Moçambique, em janeiro de 1959. Pós-graduado em Engenharia de Software, Literatura e Estudos Linguísticos, mora em São Paulo (SP), Brasil.

Obras publicadas:
Nhatsi – Elos e Laços
A Sereia de Tupã
Tanto Lá Quanto Cá
O Segredo de Felismina

Serviço:

A Nuvem se Dissipa
Davambe

Scortecci Editora
Ficção
ISBN 978-85-366-6157-5
Formato 14 x 21 cm 
152 páginas
1ª edição - 2020

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