LEMBRANÇAS / Peter Naumann

O livro é um relato de alguém que acredita na permanência da memória como um precioso legado familiar.Relata as agruras de sua família materna judia e sua lenta, mas implacável destruição sob domínio do nazismo. Com muita sensibilidade presta homenagem ao avô que suicidou-se, inconformado de ser considerado um inimigo do povo alemão. As ignomínias estatais inimagináveis alienou a família. As tentativas de alguns familiares de emigrar para salvar a vida fracassaram pela ganância dos corruptos funcionários.

O autor, no início da década de 1940, ainda criança, assistiu o desmoronamento da própria família sem, contudo, entender porque alguns parentes não mais vieram para visitar a avó. Ficou desnorteado pelo fato de sua querida prima  não mais brincou com ele. Desapareceu sem uma palavra de despedida. Os pais se divorciaram e o garoto conviveu com a mãe e sua tão querida avó materna. Após ter morado  alguns meses na casa dela, ele a auxiliou a embarcar num caminhão que a levaria a um campo de concentração.

Presenciou o aprisionamento da mãe pela Polícia Política, por ter cometido o crime de ter comprado uma cesta de ovos no mercado negro. Daí em diante viveu com o pai e avó paterna, também amedrontados por serem antifascistas. O alívio da constante ameaça nazista pairando no ar veio com a derrota militar, em 1945. Com o retorno da normalidade da vida diária, o autor resolveu emigrar para o Brasil, São Paulo, onde morava casal de tios. Ele se adaptou facilmente à vida brasileira.

Originalmente escrito por alguém que acredita na permanência da memória como um precioso legado familiar, este relato é documento histórico de alto valor: Peter Naumann não é um avô empenhado em entreter os netos, e sim testemunha de eventos que mundialmente convém relembrar. Sobrevivente do Holocausto, o autor viu a família materna desaparecer sob o violento domínio nazista.

Ainda menino, interrogava-se para onde viajavam seus parentes, pois subitamente deixavam de visitá-lo. Aos oito anos, despediu-se da avó, que com um amarrado de cobertores e uma pequena mala embarcava em um caminhão verde, numa viagem sem retorno. Aos nove, ouviu a mãe dizer ?Volto logo?. Ela bateu a porta e saiu acompanhada por dois oficiais da Gestapo. Sob proteção da família paterna, Peter foi testemunha também da instalação da ditadura stalinista no leste alemão. Não espanta, portanto, que a imigração para o Brasil, em 1953, tenha-lhe ocorrido como o encontro com o mito do paraíso tropical.

Se limitado à autobiografia, o livro valeria pela histórica tocante, profundamente pessoal. Mas o autor vai muito além, inscrevendo sua vida no destino coletivo, a partir de pesquisas iniciadas meses após a queda do Muro de Berlim. Ao falar a seus netos e bisnetos, o narrador presta homenagem à sua família e aos seis milhões de judeus assassinados pelo III Reich, lançando seu próprio memorial, na esteira do que a Alemanha começou a fazer pelas vítimas quarenta anos após o fim da Segunda Guerra Mundial.

Este livro é, sobretudo, uma poderosa afirmação da vida. Desde o humor com que comenta a inserção na vida brasileira, passando pelo romantismo de quem há 52 anos vive, em amor, com a companheira brasileira, as confidências de Peter Naumann mostram que a construção de uma nova família é sua verdadeira e mais íntima homenagem.
Luisa Destri, jornalista, é mestre em teoria e história literária

Lembranças - Em 1953, aos dezenove anos de idade, embarquei em Hamburgo no  navio que me levaria ao Brasil, país praticamente desconhecido na Alemanha. Amigos, todavia me asseguraram que é ?tão rica de formas e cores, onde os ipês floridos derramam feitiços no ambiente e a infolhescência dos cedros, às primeiras chuvas de setembro, abre a dança dos tangarás; onde há abelhas de sol, esmeraldas vivas, cigarras, sabiás, luz, cor, perfume? ? 
Monteiro Lobato

A expectativa era grande, e as dúvidas também. Será que essa gente brasileira era realmente tão cordial como diziam, as mulheres tão bonitas como eu gostaria que fossem, e as paisagens tão deslumbrantes na terra e no mar? A certeza, deduzida pelas cartas da tia, era de que os brasileiros ainda cultivavam valores que fazem parte da decência humana, abolida na Alemanha no ano em que nasci.

Nascido na Alemanha em 1934, sob ditadura de Hitler, filho de pai cristão e mãe judia. A crescente e sistemática perseguição nazista teve seu ápice no genocídio em campos de extermínio. O autor teve toda sua família materna, assassinados. Após a guerra, a implantação do comunismo na parte leste alemã o incentivou a emigrar para o Brasil onde residiam parentes. Criou raízes no novo país, casou com brasileira, e hoje, depois de 60 anos, a família conta com 17 pessoas.

Serviço:

Lembranças:
Como Contar Para Meus Netos?
Peter Naumann

Scortecci Editora
Memórias
ISBN 978-85-366-3952-9
Formato 16 x 23 cm 
228 páginas
1ª edição - 2014
Preço: R$ 30,00

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